Público-alvo
Estudantes do Ensino Fundamental – 8º e 9º anos
Este material apresenta um itinerário didático sobre um gênero relativamente novo: o microconto. A proposta busca inspirar práticas de leitura e escrita a partir de sugestões de atividades a serem desenvolvidas em alguns encontros, e que podem – e devem – ser adaptadas de acordo com o contexto escolar em que você, professora ou professor, se encontra. Mas antes, é importante tecermos algumas considerações a respeito desse gênero.
O microconto, possivelmente, popularizou-se juntamente com os meios digitais. O dinamismo que a comunicação por esses meios impuseram, favoreceu o surgimento de narrativas curtas, menores que um conto.
Considerando que toda obra literária precisa de leitoras e leitores para preenchê-la de sentido, com os microcontos essa premissa não é diferente. Por isso, trabalhar com microcontos em sala de aula permite que estudantes, enquanto leitoras(es), possam colocar-se criticamente diante do texto ficcional e das amplas possibilidades de interpretação deste.
O escritor Marcelino Freire é organizador de uma importante coletânea de microcontos intitulada Os cem menores contos brasileiros do século (2018). Esse autor defende a ideia de que os microcontos, além de um reflexo da modernidade, permitem a qualquer pessoa a produção de uma obra ficcional, e que quanto menor a quantidade de caracteres, maior o desafio.
Para saber mais assista ao vídeo LÍNGUA PORTUGUESA – Minicontos: o máximo no mínimo:
Mas quais são os elementos estruturais que compõem esse gênero? Um microconto deve obter em sua estrutura uma tríade que consiste em: brevidade, narratividade e intertextualidade.
Quando falamos em brevidade, vemos o reflexo da modernidade em nosso cotidiano, a falta de tempo e espaço em nossas vidas, e a nossa aproximação cada vez mais intensa com o meio digital. Para este gênero, a brevidade, caracterizada aqui por uma quantidade mínima de caracteres, precisa trazer uma história que possibilite a abertura de sentidos.
A narratividade é o enredo da história, o sequenciamento de ações na micronarrativa que faz com que a(o) leitora(or) perceba que há uma história sendo contada.
Já a intertextualidade diz respeito à mobilização de conhecimento do mundo da(o) leitora(or). Em outras palavras, ela(e) utiliza sua intertextualidade para preencher de sentido a narratividade presente nos microcontos. Por isso, ambos recursos andam juntos na interpretação do microconto.
Portanto a tríade brevidade, narratividade e intertextualidade são elementos fundamentais no microconto. Elementos esses que tornam o gênero conciso, mas não menos literário que o conto. Ao ler e/ou produzir microcontos precisamos considerar esses elementos estruturantes que constituem o microconto enquanto gênero literário.
Recursos materiais necessários
1
CONFISSÃO
“Fui me confessar ao mar.
O que ele disse? Nada…”
Lygia Fagundes Telles
2
O DINOSSAURO
Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá.
Augusto Monterroso
3
O PESADELO DE HOUAISS
Quando acordou, o dicionário ainda estava lá.
Joca Reiners Terron
4
Vendem-se sapatos de bebês, nunca usados.
Ernest Hemingway
5
Vá!
Quem me abandona floresce.
Andréa Del Fuego
6
Terminou de comer o bolo, o pastel, o brigadeiro e a coxinha. Pra sair, vestido preto,
afinal, branco engorda que é um horror.
Carolina de Andrade e Silva
7
TÉDIO
Após o apocalipse, a morte olha para Deus e diz:
– E agora, o que eu faço?
– Aposentadoria nunca é fácil.
Júlio César de Almeida Dutra
8
CRIAÇÃO
No sétimo dia, Deus descansou. Quando acordou, já era tarde.
Tatiana Blum
9
VIGÍLIA
Pronto nos olhos, o pranto só espera a notícia.
João Anzanello Carrascoza
10
MONÓLOGO COM A SOMBRA
Não adianta me seguir. Estou tão perdido quanto você.
Rogério Augusto
11
SÓ
Se eu soubesse o que procuro com esse controle remoto…
Fernando Bonassi
12
FUMAÇA
Olhou a casa, o ipê florido. Tudo para ela. Suspendeu a mala e foi.
Ronaldo Correia de Brito
13
DUELOS
“E agora, eu e você”, disse, sacando o punhal, na sala de espelhos.
Flávio Carneiro
14
CHICO
— Se atrasa, preocupa.
Quando chega, incomoda.
— Menstruação?
— Meu marido.
Nelson de Oliveira
15
A VIAGEM
Fora do ventre, retraiu por um segundo a face, que envelhecia.
Marcílio França Castro
Competências Específicas de Língua Portuguesa:
Práticas de linguagem / Objetos do conhecimento:
Objetos de conhecimento:
Habilidades (clique ou passe o cursor do mouse sobre os códigos das habilidades para ler suas descrições):
EF69LP47 Analisar, em textos narrativos ficcionais, as diferentes formas de composição próprias de cada gênero, os recursos coesivos que constroem a passagem do tempo e articulam suas partes, a escolha lexical típica de cada gênero para a caracterização dos cenários e dos personagens e os efeitos de sentido decorrentes dos tempos verbais, dos tipos de discurso, dos verbos de enunciação e das variedades linguísticas (no discurso direto, se houver) empregados, identificando o enredo e o foco narrativo e percebendo como se estrutura a narrativa nos diferentes gêneros e os efeitos de sentido decorrentes do foco narrativo típico de cada gênero, da caracterização dos espaços físico e psicológico e dos tempos cronológico e psicológico, das diferentes vozes no texto (do narrador, de personagens em discurso direto e indireto), do uso de pontuação expressiva, palavras e expressões conotativas e processos figurativos e do uso de recursos linguístico-gramaticais próprios a cada gênero narrativo. EF89LP33 Ler, de forma autônoma, e compreender – selecionando procedimentos e estratégias de leitura adequados a diferentes objetivos e levando em conta características dos gêneros e suportes – romances, contos contemporâneos, minicontos, fábulas contemporâneas, romances juvenis, biografias romanceadas, novelas, crônicas visuais, narrativas de ficção científica, narrativas de suspense, poemas de forma livre e fixa (como haicai), poema concreto, ciberpoema, dentre outros, expressando avaliação sobre o texto lido e estabelecendo preferências por gêneros, temas, autores.
Objetos de conhecimento:
Habilidades (clique ou passe o cursor do mouse sobre o código da habilidades para ler sua descrições):
EF69LP51Engajar-se ativamente nos processos de planejamento, textualização, revisão/edição e reescrita, tendo em vista as restrições temáticas, composicionais e estilísticas dos textos pretendidos e as configurações da situação de produção – o leitor pretendido, o suporte, o contexto de circulação do texto, as finalidades etc. – e considerando a imaginação, a estesia e a verossimilhança próprias ao texto literário. EF89LP35Criar contos ou crônicas (em especial, líricas), crônicas visuais, minicontos, narrativas de aventura e de ficção científica, dentre outros, com temáticas próprias ao gênero, usando os conhecimentos sobre os constituintes estruturais e recursos expressivos típicos dos gêneros narrativos pretendidos, e, no caso de produção em grupo, ferramentas de escrita colaborativa.
Roteiro de atividades
Objetivos:
Atividades:
Objetivos:
Atividades:
Para pontuar os elementos que compõem a micronarrativa, a sugestão é utilizar os contos: “86” de Dalton Trevisan e “Maioridade” de Rodrigo Ciríaco:
86
À saída da fábrica de bijuteria, a operária entregando a marmita suspeita:
- Ela faz barulho? Reviste. Pode Revistar. Veja quanta joia tem aí dentro.
- Só ossinho de galinha do meu almoço.
(TREVISAN, Dalton. 11 ais. São Paulo. LPM.2000. p.92.)
MAIORIDADE
- Peste! Já chega! Vou convocar seus pais agora.
- Então chama, pode chamar, prussôra. Desde que nasci, num sei nada sobre eles...
(CIRÍACO, Rodrigo. Te pego lá fora. 2ª ed. São Paulo. Editora DSOP. 2014.)
Nessa etapa é importante que você auxilie sua turma na observação dos elementos da narrativa como: enredo (narratividade), espaço, personagens e tempo. Mesmo nos microcontos, é possível identificar esses elementos e analisar como são abordados nas micronarrativas.
Para compreender melhor a estrutura desse gênero, é importante chamar a atenção para a “narratividade” do microconto, de maneira que as(os) alunas(os) percebam que há uma história sendo contada. Pois, posteriormente, na produção escrita, as(os) estudantes deverão se atentar a esse elemento, evitando incorrer na produção de versos poéticos ou aforismos na intenção de produzir um microconto.
Objetivos:
Atividades:
Sugestão:
O bilhete orientador pode ser um bom aliado para auxiliar a reescrita e aprimoramento dos textos de estudantes. Leia mais sobre essa prática aqui.
Objetivos:
Atividades:
Título do microconto | Narratividade: há uma história sendo contada? | Ela é breve? Possui poucos caracteres? (Sim ou Não) | Como as pontuações auxiliam na expressividade do microconto? | Qual o espaço da narrativa? (Onde a história acontece) | Quais as personagens? | Há referências de tempo? |
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Com esse exercício objetiva-se que a(o) aluna(o) compreenda que o microconto, apesar de curto, deve fundamentalmente contar uma história.
Objetivos:
Atividades:
Objetivos:
Atividades:
Para a avaliação, a proposta segue um perfil formativo. Deve partir de você, professora ou professor, a análise de como se deu a participação das turmas nos processos de leitura, interpretação, produção e discussão das percepções. Questionando as(os) estudantes através de discussões coletivas sobre qual foi a experiência para alunas e alunos ao se colocarem enquanto leitoras(es) diante do texto literário, explicitando suas percepções individuais e as confrontando com a opinião das(os) demais colegas. Você também poderá observar em que medida, durante as atividades, cada estudante se colocou diante dos microcontos e de que maneira utilizou as “pistas” que os microcontos oferecem para compreendê-los. E com base nesses quesitos realizar sua avaliação.
Outra possibilidade é realizar questões de autoavaliação sobre a percepção das alunas e alunos no processo: através de questionários, propor que o grupo escreva o que aprendeu, como se sentiu ao realizar as etapas das atividades, o que foi mais marcante na leitura e/ou na produção de microcontos. Essa também pode ser uma alternativa para analisar o aproveitamento das(os) estudantes nas atividades propostas.
Lembre-se de que nesse itinerário o objetivo é que a(o) estudante se coloque como leitora(or), trazendo suas percepções e conhecimentos de mundo para completar o sentido do microconto. Além disso, essa proposta tem como intenção a diminuição da resistência que possa haver quando há atividades de escrita e leitura de textos literários. Por isso, a avaliação está voltada para o aproveitamento da(o) estudante como uma(um) leitora(or) que analisa e se insere como sujeito no texto, trazendo à tona suas experiências de mundo e todo o sentimento que o texto literário, nesse caso, o microconto, possa suscitar.
A(o) aluna(o)-autora(or), compartilhando suas produções, pode desenvolver também o gosto pela escrita, pois se enxerga como escritora(or) e tem seus textos lidos por colegas e frequentadores do ambiente virtual. As produções escritas não se encerram na devolução do microconto para avaliação e obtenção de uma nota, mas se encaminham para a rede social, permitindo que mais pessoas possam desfrutar das criações literárias de sua turma.
Alessandra de Oliveira Barbosa é graduada em Letras pela Universidade Anhembi Morumbi (2012), possui pós-graduação em Letras e Literatura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2015) e mestrado pelo programa PROFLETRAS da FFLCH-USP (2020). Professora de Língua Portuguesa na rede municipal de ensino em São Paulo há 10 anos, e na rede particular por 3 anos. Trabalhou também com assessoria educacional prestando serviços para a Universidade Anhembi Morumbi e Senac. Realiza trabalho de revisão de textos e trabalhos acadêmicos.
ÁLVARES, Cristina. Quatro dimensões do microconto como mutação do conto: brevidade, narratividade, intertextualidade, transficcionalidade. GUAVIRA LETRAS, n. 15, ago.-dez. 2012. Disponível em: http://marcacini.com.br/seer/index.php/guavira/article/viewFile/284/256 Acesso em: 08 nov. 2019
BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Estética da criação verbal. Trad.: Maria Ermantina Galvão G. Pereira. Martins Fontes, São Paulo, 1997.
CIRÍACO, Rodrigo. Te pego lá fora. 2ª ed. São Paulo. Editora DSOP. 2014.
CORTÁZAR, Julio. Alguns aspectos do conto. In: Valise de cronópio. Tradução de Davi Arriguci Jr. e João A. Barbosa. São Paulo: Perspectiva, 2006.
COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. Ed. Contexto. São Paulo. 2006.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Ed. Paz e Terra. São Paulo. 1996
GOTLIB, Nádia Battella. Teoria do Conto – 11ª edição – São Paulo: Ática, 2006, 95p. – (Princípios, 2).
LAGMANOVICH, David. Iberoamericana. Vol. 09, Num.36. 2009. Disponível em: https://journals.iai.spk-berlin.de/index.php/iberoamericana/issue/view/34. Acesso em: 30 out. 2019.
MINICONTO: O MÁXIMO COM O MÍNIMO. SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação. São Paulo. (Educação de Jovens e Adultos (EJA): Mundo do Trabalho modalidade semipresencial. Vol. 3 São Paulo: SEE, 2014. Disponível em: http://www.ejamundodotrabalho.sp.gov.br/ConteudoCEEJA.aspx?MateriaID=67&tipo=Videos. Acesso em: 06 jul. de 2018.
ROJO, Violeta. La minificcíon ya no es lo que era: una aproximacíon a la literatura brevíssima. Cuadernos de literatura vol. Xx n.º39 • enero-junio 2016. p.374-386. ISSN 0122-8102.Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=5271712. Acesso em: 02 out. 2019.
ROUXEL, A.; LANGLADE, G.; REZENDE, N. L. (Org.). Leitura subjetiva e ensino de literatura. São Paulo: Alameda, 2013.
ROUXEL, Annie. Mutações epistemológicas e ensino de literatura: o advento do sujeito leitor. Trad. Samira Murad. Revista Criação & Crítica, n. 9, p.13-24, nov. 2012. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/criacaoecritica. Acesso em: 25 jan. 2019.
TREVISAN, Dalton.111 Ais. Editora L&PM Pocket, 2000.
Uma festa para os livros e para a leitura
livros, literatura, feiras literárias, formação leitora
Letramentos e as práticas de linguagem contemporâneas na escola
práticas de linguagem contemporâneas, BNCC, ensino e aprendizagem de língua portuguesa, multissemiose, multimodalidade, letramentos
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