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Atuação mediadora: uma prática integradora e compartilhada

Atuação mediadora: uma prática integradora e compartilhada

texto - Maria José Pereira de Jesus Silva; ilustração - Criss de Paulo

07 de agosto de 2023

Saberes e práticas em tempos de mudança

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Da mediação do conhecimento à aprendizagem e à vida

Cada novo encontro, com as turmas dos cursos do Programa Escrevendo o Futuro, aponta para o instigante desafio da atuação protagonista da minha própria formação e da formação de colegas professores de linguagem. Assumir esse papel me coloca diante da reflexão sobre a importância da efetiva aprendizagem da leitura e da escrita, e sobre o amplo papel da educação, uma vez que a necessidade de mais saber indica a necessidade de um mediador que seja capaz de orientar para aprender como aprender. Nesse sentido, este relato pretende apresentar aprendizagens capturadas a partir das experiências enquanto professora mediadora de cursos on-line.

O primeiro aprendizado desta vivência é a percepção sobre a importância de produzir rotas, recortes e designs educativos que produzam um saber sociocontextualizado, capaz de possibilitar o avanço do cursista na aprendizagem; se as tecnologias mudam o conceito da sala de aula, do espaço e do tempo, da comunicação audiovisual, a atuação mediadora carece da criação de pontes entre o presencial e o virtual, o estar junto e o estar conectado a distância (Moran, 2000). Nas participações mediadoras dos cursos “Sequência Didática: aprendendo por meio de resenhas” e “Caminhos da Escrita”, confirmei que ensino e aprendizagem não dependem exclusivamente de tecnologias, mas da integração entre vida, conhecimento, ética e reflexão.

Quem faz educação sabe que o que impacta sobre a vida do ser humano, impacta sobre os processos educativos. Nos ambientes virtuais, entendo a mediação do conhecimento como base para a aprendizagem e para a vida.

Do ser e fazer-se mediador de cursos on-line

Estar nos processos educativos demanda práticas diferentes daquelas tradicionalmente perpetradas. Quando assumo uma turma busco ser cada vez mais criativa, ativa e capaz de combinar reflexões e práticas pedagógicas que promovam a aprendizagem do meu grupo. De fato, não é fácil romper práticas cristalizadas, no entanto, com apoio e orientação adequada de uma coordenação é possível construir um perfil de mediador que acompanha as situações, provoca discussões e debates, sistematiza experiências e coordena equipes. É essa atuação que torna o ambiente virtual interativo, participativo e colaborativo.

Nas palavras de Masetto (2000, p. 144), o mediador age pedagogicamente quando, em sua atitude e em seu comportamento, é “facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que se apresenta com a disposição de ser uma ponte entre o aprendiz e sua aprendizagem não uma ponte estática, mas uma ponte ‘rolante’, que ativamente colabora para que o aprendiz chegue aos seus objetivos”. Realmente, o mediador tem essa função pedagógica, ao tratar um conteúdo e auxiliar o cursista a refletir sobre como relacionar, organizar e discutir informações com os colegas. Nessa acepção, minhas ações mediadoras buscam favorecer condições para a produção de conhecimento significativo por eles, a fim de serem capazes de realizar a transposição didática.

Por vezes esse papel não se limita à atuação pedagógica, posto que há necessidade de uma conexão com o universo de referências culturais dos cursistas, pressupondo que minha ação, além de pautada no saber sobre como o grupo se relaciona com os conteúdos, se conecte às habilidades tecnológicas que já sabem usar. Portanto, muitas vezes é preciso atuar pedagógica e tecnicamente. Mesmo com todo auxílio do suporte técnico, em muitas situações os participantes tendem a procurar o mediador; quando solicitada para essas questões, minha experiência e domínio da ferramenta me permite orientar quanto ao que deve ser feito. Tenho notado que as respostas imediatas, a colaboração espontânea e o estar próximo criam um vínculo que contribui para a permanência de todos.

Essa atuação técnico-pedagógica exige que eu faça uma abordagem de formação contextualizada, reflexiva e afetiva. Contextualizada, no sentido de fornecer aos participantes um conteúdo de qualidade, organizado, abrangendo do layout à pertinência de textos e de atividades, um repertório real, capaz de promover o desequilíbrio do saber, e, ao mesmo tempo, o conhecimento fundamental desejado para sua prática. Reflexiva, por estar em contato com outras experiências, percebendo-me nas semelhanças/diferenças por meio de depoimentos de colegas, conhecendo teorias e realizando atividades que requerem o repensar das práticas. Afetiva, construída na relação de contínuo esforço para que o cursista não se sinta só, como se conversasse com uma máquina.

Sempre considerei a abordagem afetiva merecedora de destaque, porque lidar com recursos e conteúdos não familiarizados intimida os participantes. Além disso, a dificuldade do contato e do diálogo face a face pode caracterizar um ambiente distante, frio; no entanto, se eles encontram no mediador um professor com linguagem técnica, e também afetiva, as relações virtuais ganham novos sentidos. Ao longo de mais de dez anos de experiência com mediação de cursos on-line percebo como alguns grupos são mais ativos, outros nem tanto, algumas turmas são muito motivadas e maduras, e outras ainda não alcançaram esse nível. Procuro a proposta mais adequada, o equilíbrio necessário entre o virtual e o afetivo, afinal, “o mais importante é a credibilidade do professor, sua capacidade de estabelecer laços de empatia, de afeto, de colaboração, de incentivo, de manter o equilíbrio entre flexibilidade e organização” (Moran, 2000, p. 55).

Do tom da mediação integradora e compartilhada

A organização da ação comunicativa que estabeleço com meu grupo preza muito pelo domínio de formas de interação e intervenção nas múltiplas dimensões do saber. Num diálogo constante com eles busco orientar, esclarecer, contornar ou estimular a participação. A presencialidade – via chat, mensagem privada, intervenção nos fóruns ou feedbacks – focaliza uma comunicação que seja bem cuidada, adequada e eficaz.

Ao conectar-me com participantes de diferentes lugares tenho a oportunidade de conhecer um universo de referências culturais, pressupondo ações capazes de relacionar habilidades que dominam com aquelas que serão desenvolvidas durante o curso. Não é tarefa fácil quando as turmas são numerosas, mas atenta às participações e ao desempenho individual de cada um, somados a uma orientação de coordenação do curso que mantém uma postura firme, equilibrada e afetiva me sinto em condições para também atuar lado a lado do cursista, em condições de apropriação significativa. É importante reafirmar que, além de sentir sua experiência cotidiana e sua identidade cultural valorizadas, o participante precisa perceber o quanto o conteúdo estudado é útil para sua prática.

Nessa ação comunicativa, não é suficiente participar, é preciso interagir, cooperar, e reconhecer que muitos assuntos surgirão, estilos de aprendizagem e diferentes formas de interação ocorrerão. Atentemo-nos para o que pensa Almeida (2003, p. 334):

Participar de um ambiente virtual digital se aproxima do estar junto virtual, uma vez que atuar nesse ambiente significa expressar pensamentos, tomar decisões, dialogar, trocar informações e experiências e produzir conhecimento. As interações por meio dos recursos disponíveis no ambiente propiciam as trocas individuais e a construção de grupos colaborativos que interagem, discutem problemáticas e temas de interesses comuns, pesquisam e criam produtos ao mesmo tempo que se desenvolvem.

Dessa maneira, o modo como procuro estabelecer a relação de confiança, equilíbrio e empatia com os diferentes grupos tem me ofertado como resposta que esse modo de olhar e conduzir favorece os melhores resultados. Ainda que seja impossível esgotar as possibilidades da relação entre mediador e cursista, tenho amadurecido alternativas que me parecem encurtar o espaço dessa relação, como: apresentação pessoal e acolhimento afetuoso; mensagens individuais, reconhecendo a atuação e orientando quanto às dificuldades ou aos progressos (é significativo usar o nome dele nessas mensagens); valorização das participações que agregam o aprofundamento do estudo; incentivo à investigação reflexiva e autônoma.

Das possibilidades da atuação mediadora

Encontrei no diálogo constante uma prática consistente para atuar como mediadora da aprendizagem, porque ao trocar experiências nos fóruns, debater dúvidas e problemas suscitados, estabeleço um canal efetivo da reflexão sobre a prática. Essa atuação conclama uma postura em que linguagem, pensamento e ação estão intimamente (inter)relacionados. Nesse viés, as ferramentas síncronas e assíncronas me ajudam a criar um canal de diálogo capaz de potencializar suas funções pedagógicas e alcançar os participantes.

O uso de ferramentas síncronas me possibilita uma intervenção rápida, pontual, sobre um tema ou uma dúvida. Os chats, disponíveis nos cursos “Sequência Didática: aprendendo por meio de resenhas” e “Caminhos da Escrita”, por exemplo, consentem um atendimento personalizado. Contudo, exige rapidez na compreensão das mensagens e habilidade para sintetizar, organizar e responder ao cursista de maneira clara, compreensível.

As ferramentas assíncronas, disponíveis em cursos como “Leitura vai, escrita vem”, auxiliam na discussão de temas e na aprendizagem de conteúdos em tempos distintos, com a vantagem da flexibilização de horário, de lugar, de condução do ritmo individual e da reflexão. Para que atendam à sua finalidade de comunicação e de contextualização, precisam ser exploradas por meio de feedbacks de participação.

Ao criar uma rotina de feedbacks consigo interagir e auxiliar os inscritos na construção dos seus próprios saberes. Tais devolutivas podem ser enviadas por mensagens privadas (para dar retorno imediato sobre uma dúvida, identificar equívocos ou propor correções), mensagens coletivas (para orientar sobre etapas do processo) e devolutivas sobre o desempenho em tarefas (para alertar quanto à necessidade de se atender aos critérios de avaliação).

Percebo como os participantes ficam surpresos ao receber seus feedbacks, não se trata apenas da apresentação de um conceito vazio, mas de um diálogo consistente daquilo que foi apresentado com ideias abordadas no curso.

Nos fóruns, à medida que a participação ocorre, realizo intervenções planejadas, com o intuito do compartilhamento de experiências e discussão de conceitos fundamentados no curso. Essas conversas geralmente são individuais (em situações que carecem de um olhar específico em função de abordagem equivocada ou que favoreça novas e enriquecedoras discussões) ou coletivas (fazendo-se um apanhado do que já foi dito).

Na mensagem de abertura convoco a turma e retomo a comanda da tarefa, com orientações claras e enxutas. Nas intervenções, provoco a discussão sobre determinado assunto que surgiu e incentivo a abertura de novos tópicos, por meio de aspectos ainda não alcançados. E, na mensagem de fechamento, busco compor uma síntese clara que reúna vozes dos participantes e construa uma relação sinalizadora das convergências e divergências de posições do grupo.

Da beleza que o mediador não dá conta de ver sozinho

Estar e ser mediadora de cursos on-line tem me oportunizado desconstruir lugares-comuns do meu saber e da minha formação, me movimento do lugar distante que estou para estar próxima às singularidades de meus cursistas, para buscar a sensibilidade e a inovação necessária a fim de construir uma rede de sustentação à prática. É a vivência, a mobilização das emoções, o aprender no uso dos recursos tecnológicos, a experiência como base para a formação que criam o verdadeiro ambiente virtual de aprendizagem: integrado e compartilhado.

Na experiência substancial dos cursos on-line do Programa Escrevendo o Futuro, aprendo sobre a importância de ter um curso com conteúdo que favoreça o repertório formativo dos participantes numa proposta alinhada à prática, do valoroso resultado que se tem quando uma equipe de mediadores conta com uma coordenação que acompanha, integra e orienta, com firmeza e delicadeza, e, quando o grupo de mediadores se compromete com a formação de todos os participantes. Quem já participou dos cursos do Programa Escrevendo o Futuro sabe bem o impacto positivo sobre sua formação, além do conteúdo nutritivo e inspirador, a atuação mediadora humaniza o ambiente tecnológico, e esse é o grande diferencial.

Quando entro em uma turma acreditando que já conheço muito do conteúdo e das ferramentas da plataforma, encerro com a certeza de que ainda há muito a saber. Aprendo nesses cursos em parceria, cooperando e aceitando colaborações, acolhendo críticas e afetividades: belezas da mediação.

Nas palavras de Bartolomeu Campos de Queirós: “A beleza é tudo aquilo que você não dá conta de ver sozinho...”, e por não dar conta sozinho da beleza das aprendizagens, nós, mediadores, dividimos conhecimentos e sentidos.

Um mediador sabe dos ventos e das tempestades que seus cursistas enfrentam, das adversidades no uso das tecnologias, da complexidade na organização de suas rotinas, da emoção quando concluem, com êxito, um curso. Um mediador se emociona quando vê o progresso de sua turma, intriga-se nas conclusões sobre a transposição didática, cuida com responsabilidade do desempenho dos participantes, comemora os bons resultados após dias lendo, relendo e dando feedbacks, diverte-se com as conversas nos fóruns e sente a necessidade de dividir as belezas da mediação.

Do lado da tela ressoam vozes mediadoras, que fazem brotar o saber sobre a beleza singular que é guiar pessoas em uma experiência de curso on-line. Uma beleza que não damos conta de ver sozinhos, e, por isto, fazemo-na transbordar e a compartilhamos.

 


Maria José Pereira de Jesus Silva é formada em Letras, especialista em Mídias e Tecnologias (PUC-RJ) e em Coordenação Pedagógica (UFBA- BA), mediadora dos cursos on-line do Programa Escrevendo o Futuro, e coordenadora municipal da Olimpíada da Língua Portuguesa (Ribeira do Pombal – BA).


 

Referências

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de. “Educação a distância na internet: abordagens e contribuições dos ambientes digitais de aprendizagem”. Educação e Pesquisa, v. 29, nº 2, 2003, pp. 327-340.

MASETTO, Marcos T. “Mediação pedagógica e o uso da tecnologia”, in: Moran, José Manuel (org.). Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000, pp. 133-172.

MORAN, José Manuel (org.). Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas: Papirus, 2000.

QUEIRÓS, Bartolomeu Campos de. “A infância e o livro”. Instituto Ecofuturo. Disponível em <http://ecofuturo.org.br/ a-infancia-e-o-livro>. Acesso em 2 de maio de 2020.

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