O lugar onde o poeta vive

Para esta oficina escolhemos como ponto de partida a leitura de dois poemas: “Milagre no Corcovado”, de Ângela Leite de Souza, e “Cidadezinha”, de Mario Quintana. Nesta primeira etapa vamos levar os alunos a perceber o tema dos poemas: um lugar onde o poeta vive ou que aprecia muito. Na segunda etapa vamos ver que os poetas falam de tema semelhante e usam recursos poéticos parecidos.

Para saber mais, confira o artigo “O lugar onde vivo – Um dedo de prosa sobre o tema”, de Ana Maria de Carvalho Luz, na revista Na Ponta do Lápis, nº 20, p. 12, disponível na Biblioteca do Portal.

Atividades

  1. O primeiro poema retrata o Rio de Janeiro. Comece perguntando se os alunos conhecem essa cidade. Se já viram fotos ou imagens na televisão do Cristo Redentor, no Corcovado. O que conhecem dessa cidade? O que mais os impressiona?
  2. Se possível, leve imagens do Rio de Janeiro, principalmente do Corcovado. Você pode pesquisar essas imagens em sites de busca, digitando a palavra “Corcovado”, entre aspas. Depois leia o poema “Milagre no Corcovado”, de Ângela Leite de Souza. Para fazer essa leitura, não se esqueça de retomar as orientações da Oficina 4. Se preferir, ouça o poema no menu “Coletâneas”.
  3. Milagre no Corcovado

    Todas as noites
    de céu nublado
    no Corcovado
    faz seu milagre
    o Redentor:
    fica pousado
    no algodão-doce
    iluminado
    como se fosse
    de isopor.

    Mas todos sabem
    que bem de perto
    esse Jesus
    é um gigante
    de mais de mil
    e cem toneladas…
    Suba de trem,
    vá pela estrada,
    quem chega lá,
    ao pé do Cristo,
    vira mosquito.

    E olhando em volta
    para a cidade
    de ponta a ponta
    maravilhosa
    a gente sente
    um arrepio:
    o milagre
    é o próprio Rio!

    Ângela Leite de Souza. Meus Rios. Belo Horizonte: Formato, 2000.

  4. Após a leitura, pergunte aos alunos qual é o tema do poema, do que fala a autora.
  5. Comente com eles a diferença de dimensão que os objetos assumem, vistos de longe ou de perto.
  6. Peça-lhes que releiam o poema e procurem imaginar o que a poetisa quis nos mostrar. Ajude-os com perguntas e observações.
    • Há rimas? Onde se encontram? Os versos têm o mesmo tamanho? O ritmo é marcado ou não?
    • Ocorrem repetições de palavras, de versos, de letras?
    • O poema fala de dois milagres: localizá-los no texto e identificar se, no poema, estão próximos ou distantes um do outro.
    • Qual o sentido da expressão “algodão-doce”? Trata-se de linguagem própria ou figurada?
    • Há outros empregos parecidos no poema? Se houver figuras, identifique-as.
    • A segunda estrofe começa com a palavra “mas”, que indica oposição; assim, a primeira estrofe se opõe à segunda. Mostrar essa oposição, justificando com passagens do texto.
    • Qual seria a causa do “arrepio” do final?
  7. Feita a análise, diga-lhes que voltarão ao texto após a leitura de outro poema, com o qual aquele vai ser comparado.
  8.  

    Uma análise aprimorada

    Rimas consoantes – aquelas em que rimam tanto as vogais quanto as consoantes. Primeira estrofe: nublado / Corcovado; Redentor / isopor; doce / fosse. Segunda estrofe: toneladas / estrada; arrepio / Rio.

    No poema também há a rima toante – quando coincide apenas o som da vogal tônica das palavras: Ao pé do Cristo, vira mosquito.

    Os versos, na maioria, são curtos; a sonoridade e o ritmo do poema são marcados. Repete-se a palavra “milagre” duas vezes: uma, na primeira estrofe; outra, na segunda, além de ela figurar no título do poema. O primeiro “milagre”, no texto, está apresentado por meio de uma metáfora: “o Redentor: / fica pousado / no algodão-doce”.

    Ela se complementa por uma comparação, com o termo comparativo expresso: iluminado / como se fosse / de isopor. Tanto “nuvem” quanto “isopor” indicam figuradamente a imagem vista pelos habitantes da cidade: a bruma que envolve a estátua, em tons de cinza-claro; e a própria estátua, branca, pairando acima delas.

    O termo “mas”, indicador de oposição, separa as duas primeiras estrofes pelo seguinte motivo: o “milagre” da primeira é um efeito visual da noite nublada, uma espécie de ilusão de ótica, isto é, o olhar pensa ver o que o verso descreve, mas quem olha sabe que, na verdade, se trata de uma estátua acima das nuvens; o “milagre” da segunda é a vista real que se tem do alto do Corcovado: a paisagem da cidade maravilhosa, tão impressionante, que causa “arrepio” em quem a contempla.

  9. Projete e leia a seguir o poema “Cidadezinha”, de Mario Quintana; você também pode ouvir a gravação logo abaixo.
  10. Cidadezinha

    Cidadezinha cheia de graça…
    Tão pequenina que até causa dó!
    Com seus burricos a pastar na praça…
    Sua igrejinha de uma torre só…

    Nuvens que venham, nuvens e asas,
    Não param nunca nem um segundo…
    E fica a torre, sobre as velhas casas,
    Fica cismando como é vasto o mundo!…

    Eu que de longe venho perdido,
    Sem pouso fixo (a triste sina!)
    Ah, quem me dera ter lá nascido!

    Lá toda a vida poder morar!
    Cidadezinha… Tão pequenina
    Que toda cabe num só olhar…

    Mario Quintana, in: Lili inventa o mundo. São Paulo: Global, 2005. © by Elena Quintana.
    Acesse o site da Casa da Cultura Mário Quintana.

  11. Pergunte aos alunos qual o tema do poema e qual o seu tom: se alegre, triste ou melancólico.
  12. Solicite-lhes que procurem em um dicionário (impresso ou virtual) os dois últimos termos, para precisar a resposta. Melancólico e melancolia são termos que remetem a uma tristeza indefinida e sem causa precisa. Seria esse o caso do poema?
  13. Em seguida, eles devem reler o poema para tentar imaginar a cidade descrita pelo poeta. Grande ou pequena? Movimentada ou tranquila? Com igreja de que tamanho? Depois devem estabelecer um paralelo entre a cidade do texto e aquela em que moram, justificando a resposta: são parecidas ou diferentes?
  14. Por fim, peça aos alunos que interpretem os sentimentos do poeta em relação à cidade.

Para saber mais

Sobre “Cidadezinha”

Leve os alunos a notar que o poema tem quatro estrofes desiguais: dois quartetos, seguidos de dois tercetos (estrofes de três versos). As rimas estão nos versos pares, nos dois quartetos; nos tercetos, rimam os versos 1 e 3. O ritmo é regular e cadenciado.

Logo no título aparece um diminutivo. Comente com eles o efeito desse emprego: indica tamanho apenas, ou sugere algo mais? Supõe-se que eles notem o tom afetivo, carinhoso, igualmente presente em outros diminutivos: pequenina (duas vezes), burricos, igrejinha, cidadezinha (segunda ocorrência, além da do título).

No segundo quarteto, o termo “nuvens” – metaforicamente presente no poema anterior, na expressão “algodão-doce” – vem repetido duas vezes, sugerindo movimento: “Nuvens que venham, nuvens e asas, / Não param nunca nem um segundo”.

A imagem de altura é sugerida por qual elemento? Os alunos vão identificar a torre personificada, pois o poeta a faz refletir como um ser humano: “Fica cismando como é vasto o mundo!…”.

Interpretando os versos finais: “Tão pequenina / Que toda cabe num só olhar…”, podemos dizer que para caber “num só olhar” é preciso contemplar de uma certa distância, pois, de perto, a visão seria diferente. Seria esse um ponto de semelhança com o poema anterior?