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“Professora, meu texto me fez mais humana”

Ana Virgínia Domingos / Edição: Camila Prado

07 de agosto de 2023

 

A professora Ana Virgínia Domingos de Oliveira estava com a mira muito além do ENEM quando propôs ao 3º ano D trabalhar no projeto “Escrevendo crônicas: o despertar da partilha sob novos olhares”. A importância de desenvolver o texto dissertativo-argumentativo, cobrado no exame nacional, é inquestionável, mas o olhar apurado que a crônica desperta, inclusive para aquilo que muitas vezes está debaixo do nariz, pode trazer mudanças para a vida toda. Aqui, Virgínia nos revela o quanto valeu a pena todo o seu “atrevimento” – como ela mesma classificou – em escolher um gênero teoricamente fora de hora, transformando o desinteresse e a falta de confiança de seus alunos da Escola Estadual de Educação Profissional Dr. José Alves, em Quixeramobim (CE), em experiências de partilha e autoria.

 

“Quando os alunos chegam ao último ano do Ensino Médio, têm a visão de que passarão muito tempo com o texto dissertativo-argumentativo. Sabem que precisam desse treinamento. Porém, apesar dessa consciência, muitos ainda não têm abertura suficiente para a escrita. Assim, atrevi-me a começar o ano trabalhando crônica com minhas quatro turmas de 3º ano. Queria um gênero mais leve, que pudesse acordá-los para o prazer da escrita. Também pretendia convidá-los a começar o último ano com mais reflexão: quem vive a realidade de uma escola profissional como a nossa, em que os alunos ficam o dia inteirinho aqui, sabe que tudo é muito intenso e que a gente precisa parar para observar ao nosso redor, observar o colega. Aqui todos partilham da mesma rotina, mas têm origens e perfis muito distintos. Tenho alunos da zona rural, que pegam ônibus de madrugada para chegar à escola, e outros que moram perto.

Quando recebi o convite da Olimpíada para desenvolver uma sequência didática, resolvi manter o gênero crônica e escolhi trabalhar com o 3º ano D, turma que já vinha se mostrando a mais difícil de produzir. Nos primeiros exercícios de escrita, lembro-me que um dia terminei a aula muito decepcionada: dos 44 alunos, apenas um me entregou o texto. No ano passado, quando o foco era artigo de opinião, essa turma foi a que apresentou maior resistência. Trabalhar com uma classe mais fácil seria muito conveniente, mas justamente essa adversidade me fez continuar buscando estratégias para mudar. Desenvolver essa SD foi muito importante para mim, vi que estava muito presa, descobri a importância de adaptar o trabalho à realidade da turma, a importância de planejar, pensar melhor no passo a passo.

Para eles foi um desafio, e para mim também. Tanto planejar como ir atrás do material, refletir sobre minha prática, sair um pouco da zona de conforto de ficar nos gêneros da Olimpíada. Li muita coisa sobre o tema.

 

A descoberta da crônica

Alguns afirmaram que já tinham visto o gênero. Mas nunca tinham parado para olhar a crônica da forma que ela merece. Ver a surpresa deles ao se descobrirem entendendo o que é uma crônica, foi muito positivo. Isso aconteceu em momentos diferentes para cada um. As leituras compartilhadas, em que liam para a classe suas produções ou mesmo crônicas de escritores, ajudaram demais. Quando ouviam um colega lendo seu texto, atinavam ‘Nossa, crônica é isso? Sou capaz de fazer uma.’ Os que escreviam melhor acabavam inspirando os demais a acreditar na sua potencialidade também. A escrita tem a capacidade de nos atingir. ‘Professora, meu texto me fez mais humana’, disse uma aluna. E um começou a ajudar o outro em sala. Quando eu vi isso surgir, criamos uma espécie de monitoria que deu muito certo. Eram grupos em que os alunos mais desenvolvidos dentro desse gênero ajudavam os que ainda não conseguiam produzir, com leituras, dicas, ou mesmo ajuda na própria escrita.

O que não estava no planejamento inicial do projeto, mas que também deu um resultado surpreendente, foi a visita do escritor da nossa cidade, Bruno Paulino, à escola. Ele conversou com a turma sobre o gênero e ouviu alguns alunos lendo as produções deles. Outro ponto importante foi a criação da página Conexões Literárias (https://www.facebook.com/conexoesliterarias), onde estamos divulgando as crônicas, que também sairão em um livro. Faremos o lançamento aqui na escola em breve!

Fui percebendo que estava no caminho certo, que muitos estavam pegando o gosto pela produção de crônicas e até indo além do que eu estava pedindo. Muitas vezes eu estava em casa e recebia mensagens pelo celular ‘Professora, tem um tempo? Olhe se eu fiz uma crônica’. Ou mesmo na escola, entre uma aula e outra, apareciam com um pedacinho de papel, com uma letra bem caprichada, para me entregar um texto. Quando compartilhavam a produção que tinha saído deles, dava para ver que se sentiam verdadeiros autores.

Uma das crônicas que mais me marcaram foi de um aluno que demonstrava muita resistência e às vezes de pouca participação e entrosamento em sala de aula. ‘Professora, posso escrever uma crônica sobre meu cabelo?’ O texto ficou muito interessante, foi um processo de descobrimento e de aceitação da forma como ele era. E ele se descobriu apaixonado por crônica! Mesmo quando você escuta da boca do aluno que ele não consegue ou se acha incapaz, alguém precisa apostar nele. No momento que você transmite isso, ele se sente capaz, com vontade de tentar. E ele consegue. Então, acho que o que mais aprendi nesse processo foi arriscar, ousar mais e de modo algum me conformar com pouco.”

___________________

Assista ao vídeo da mesa que a professora Ana Virgínia integrou durante o Seminário Nacional Escrevendo o Futuro:

 

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