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"A função concreta do texto"

Michele Mendes Rocha / Edição: Camila Prado

07 de agosto de 2023

 

Uma crítica construtiva pode se tornar uma crítica que leva à construção. É isso que nos revela o projeto “Argumentação que leva à estrada da cidadania”, desenvolvido pela professora Michele Mendes Rocha de Oliveira, do Instituto Federal do Amazonas, em Tabatinga (AM), e apresentado no Seminário Nacional Escrevendo o Futuro. Alunos de quatro turmas do 3º ano do Ensino Médio engajaram-se na composição de uma carta de solicitação ao prefeito para reivindicar a pavimentação da rua da escola. Aqui, Michele nos conta como foi fundamental a parceria dos professores de Geografia, História, Biologia, Sociologia e Química na construção de argumentos para lá de sólidos.

 

 

“Na situação que a gente vivia em Tabatinga, os alunos tinham dificuldade de acesso ao campus. Isso sempre era a conversa deles. Chegavam com lama no pé, caíam de moto, ficavam atolados. Às vezes não conseguiam chegar. Usavam até botas para transitar no meio dos buracos, do barro, entre carros e tudo o mais.

Estamos de seis a sete dias subindo o rio de barco de Manaus, numa cidade movida a gerador, que fica na divisa entre Brasil, Colômbia e Peru. Um dia, eu disse aos alunos ‘Aqui começa o Brasil’, ao que um deles, diante de toda a precariedade, respondeu ‘Não, professora, aqui termina o Brasil. Não tem nada!’

Em 2014, havia ocorrido uma pavimentação da rua que não durou nada, pois apenas foi colocado o piche sem levar em consideração as especificidades da pavimentação no Amazonas.

Dessa necessidade, surgiu o projeto: fazer uma carta de solicitação ao prefeito para que a rua fosse pavimentada. O texto tinha um interlocutor real. Havia, assim, uma grande preocupação com a escolha de cada palavra. ‘Professora, nunca tive tanta vontade de escrever um texto na minha vida’, falou um aluno.

Para que construíssem uma argumentação contundente, pensei de trazer o trabalho de alguns professores. Acho que o pulo do gato do meu trabalho foi esse, porque geralmente eu dizia ‘agora você pesquisa lá sobre tal coisa’. Mas desta vez, fiz diferente. Programei um ciclo de palestras com cinco professores. Até fiquei com um pouco de medo, porque as palestras tiveram que ser em sequência, mas a atitude dos colegas foi muito importante, porque levaram a linguagem dos jovens, foram muito dinâmicos. Todos ali queriam que aquela demanda fosse resolvida.

 

Tim-tim por tim-tim

A professora de História falou sobre a carta no Brasil, a importância de seu papel desde Pero Vaz de Caminha, e lembrou de cartas que foram importantes para o país, mostrando o quão relevante era a atividade que estavam fazendo. O professor de Biologia falou sobre o bioma amazônico, a mata ciliar, a nossa região próxima da várzea, que o rio sobe e desce... O professor de Geografia falou sobre o clima, o relevo e a importância da questão hidrográfica, porque a gente mora numa região cheia de vazante, com solo arenoso e drenagem diferente de um solo de terra firme. Também falou sobre a biomimética, que consiste em estudar a natureza para criar soluções inspiradas nela quando vamos fazer uma intervenção. A professora de Sociologia trouxe a questão dos impactos sociais gerados por essa falta de trafegabilidade na rua. Se uma pessoa passasse mal, não havia acesso a pronto-socorro porque a viatura não conseguia chegar. Falamos sobre os moradores. Abordamos todos os aspectos. O professor de Química trabalhou a química do solo. Unindo a palestra dele com a de Geografia e a de Biologia, ele trouxe a análise do solo e propôs a questão do tipo de pavimentação mais adequado. Trabalhou com a química da pavimentação também. Analisou vantagens e desvantagens da pavimentação com asfalto ou concreto, segundo o solo daqui. E aí chegou-se à conclusão que deveria ser feita com concreto, e não asfalto, como em outras regiões do Brasil.

Dentro do planejamento que eu tinha com eles, mostrei que a carta de solicitação não é só reclamar, mas propor uma solução. E tinham que propor embasados.

Tivemos várias outras fases no projeto. Cada uma das quatro turmas fez entrevistas – que utilizei como gênero de apoio – com outros alunos, servidores, pais e moradores. Conseguimos juntar informação de tudo que era lado para fazer a carta. O projeto começou em abril e seguiu até 23 de junho. Foi bem intenso. O prefeito se propôs a ir à escola dar a resposta para todos, e declarou ‘Vamos fazer como foi solicitado: em concreto armado.’ Hoje, dia 3 de outubro, a gente já tem fotos da concretagem da rua. Literalmente uma vitória concreta que vai marcar a vida deles. Vão passar por aquela rua e dizer ‘Fiz parte dessa ação’. Ver o papel da escrita cidadã, o papel que a língua exerce, a função social, vê-los não escrever para a caneta vermelha do professor, mas escrever para atingir um objetivo na sociedade foi muito importante para mim.”

___________________

Assista ao vídeo da mesa que a professora Michele integrou durante o Seminário Nacional Escrevendo o Futuro:

 

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