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A formação continuada dos educadores do Ensino Médio e seu impacto

Beatriz Santomauro

07 de agosto de 2023


Ensino Médio, Qualidade e Equidade - Avanços e Desafios em Quatro Estados: CE, GO PE e SP” é a mais recente pesquisa divulgada pelo Cenpec. O objetivo do estudo é trazer um raio X das escolas desse segmento em quatro estados e mostrar de que forma as redes se organizam em relação à formação dos professores, diversificação de oferta de matrículas, organização do currículo, monitoramento da aprendizagem e avaliação dos resultados (leia mais aqui). “Concentramos nossos estudos em Pernambuco, São Paulo e Goiás, que têm os mais altos índices de desempenho dos estudantes no Ensino Médio no Brasil, e no Ceará, que se destaca pelos resultados no Ensino Fundamental”, diz Antônio Augusto Gomes Batista, coordenador de pesquisas do Cenpec. Sobre a formação de professores, ele ressaltou que as políticas nesses locais seguem um novo modelo: além de atenderem demandas por capacitação em determinados temas, valorizam a formação em serviço, aquela que analisa a prática dos profissionais e promove melhoras conforme as necessidades percebidas. Em Goiás, por exemplo, ela ocorre via tutoria de um par mais avançado ou de um coordenador. No Ceará, são os profissionais de órgãos regionais – intermediários entre as escolas e as secretarias –que identificam as necessidades dos educadores e os caminhos para atendê-las. O monitoramento dos resultados desse trabalho é sistemático e gera novas formas de intervenção.


No bate papo que você lê abaixo, Dute, como Antonio é conhecido, falou com nossa reportagem durante mais de uma hora com a clareza de um bom mineiro e a precisão de um pesquisador. Ele destacou alguns dos resultados obtidos em relação à formação dos profissionais do Ensino Médio: quais dados surpreenderam até os especialistas e as hipóteses sobre as consequências das políticas educacionais atuais, e terminou a conversa dando um recado para os educadores do Escrevendo o Futuro.

Boa leitura!

 

1. De acordo com a pesquisa, a porcentagem de professores atendidos por formação continuada aumentou no período analisado. Podemos concluir que os professores do Ensino Médio estão recebendo mais atenção das políticas?

Não necessariamente. Os números mostram melhoras, mas o modelo adotado não parece trazer os impactos que queremos. A formação continuada está atrelada aos resultados das avaliações externas, que na maior parte das vezes são restritos à Língua Portuguesa e Matemática. Com isso, só os educadores dessas disciplinas recebem programas formativos e as demais áreas não têm prioridade. Em Pernambuco, por exemplo, os cursos são majoritariamente nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática, em razão da pressão das avaliações e das políticas de bonificação. Outros programas de formação pretendem melhorar o desempenho dos estudantes no ENEM, o que ainda sim é restrito.

 

2. Quais as consequências desse quadro para a educação?

As restrições atuais causam a diminuição das funções educativas da escola, que devem ser mais amplas. Precisaríamos de formações continuadas pautadas pelo currículo, já que isso foi o combinado com a comunidade.

 

3. E o que se nota em relação à formação inicial dos educadores?

Nos quatro estados analisados, assim como no restante do país, muitos dos professores lecionam em áreas diferentes de suas formações iniciais porque a carreira docente não é atrativa. Historicamente já existia um déficit de educadores de Química, Física e até mesmo de Matemática nas salas de aula, mas temos visto uma falta generalizada de profissionais com licenciatura adequada. É preciso de políticas que transformem essa situação.

 

4. O indicador de esforço docente criado pelo Inep analisa o número de escolas em que o docente da Educação Básica atua, número de turnos de trabalho, número de alunos atendidos e número de etapas nas quais leciona. Conforme a pesquisa apontou, pode-se dizer que o indicador mensura a carga de trabalho. São 6 níveis e a maior parte dos professores entrevistados se encaixa no nível 4, aquele que têm entre 50 e 400 alunos e que leciona em 2 turnos e em duas etapas. Como isso afeta a dedicação deles para a formação continuada?

O professor precisa de tempo. O excesso de horas ocupadas dificulta a participação do profissional nos programas de formação e em outras formas de capacitação. Para conseguir dar conta da rotina, ele procura caminhos mais práticos, de repetição de uma mesma forma de lecionar, o que causa extremo cansaço e muito desânimo.

Vemos que os educadores das escolas de tempo integral têm mais condições de participar de cursos de formação, além de se aprofundarem melhor sobre as condições da escola e dos alunos, já que se dedicam a uma mesma instituição. O que também afeta a participação do educador em programa de formação continuada é a falta de valorização desses estudos nos planos de carreira. Embora as regras desses planos sejam estabelecidas pelas próprias redes para identificar ações dos profissionais e promover aumento do salário ou melhorias nas condições de trabalho, elas não incentivam os processos de formação. Se o profissional acumula anos de trabalho, na maior parte das vezes consegue benefícios maiores do que se ele participa de um processo de formação continuada.

 

5. Essa pesquisa surpreendeu os pesquisadores em algum aspecto?

Foram duas boas surpresas. A primeira delas é que embora haja uma forte correlação entre origem social e matrículas em Escolas de Tempo Integral, essa associação pode ser evitada pelas políticas públicas. Normalmente, a presença das escolas de tempo integral gera desigualdade porque atraem os estudantes com maior renda, que não precisam trabalhar e que podem se dedicar aos estudos, e excluem os demais, que se matriculam nas escolas de tempo parcial. Os resultados preliminares da nossa pesquisa demonstram que em Pernambuco essa correlação não ocorre. Isso se dá porque na implementação da política de expansão das escolas de tempo integral foram contemplados e, todos os municípios do estado, sendo que em 76% dos locais essa é a única instituição, o que resultou num ganho de equidade.

A segunda surpresa foi em relação às soluções criativas. Como dissemos, de modo geral os estudantes academicamente mais fortes são atraídos para as escolas de tempo integral e, em contra partida, as escolas de tempo parcial passam a lidar com uma realidade nova. No entanto, em uma escola de tempo parcial visitada durante o trabalho de campo, encontramos uma diretora que conseguiu recuperar o prestígio da escola junto à comunidade a partir de uma parceria com as empresas locais, que passaram a contratar como estagiários os estudantes com bom desempenho. Neste município, há apenas duas escolas, uma de tempo integral e outra de tempo parcial, porém esta última conseguiu atrair os estudantes demonstrando o valor do estudo, mostrando que frutos podem ser colhidos, assim como ocorre com os estudantes das escolas de tempo integral.

 

6. A versão que temos hoje da pesquisa é preliminar. Quais os próximos passos em relação à formação dos educadores?

Queremos verificar se a hipótese de que as políticas atuais têm uma eficácia reduzida é comprovada com dados. Embora essas ações gerem rapidamente avanços nos resultados educacionais porque organizam as escolas – estabelecendo currículos, monitorando e avaliando –, não levam à equidade e trazem prejuízos em relação à carreira docente. Isso não favorece a atração dos melhores profissionais e nem a formação mais adequada dos que já estão na sala de aula.

 

7. De que forma a pesquisa conversa com o público do Escrevendo o Futuro?

A educação está sempre ligada à sociedade. O que nós fazemos, seja uma política educacional ou uma decisão de sala de aula, pode contribuir para acirrar ou atenuar as diferenças da sociedade. Assim como os gestores públicos, o professor tem que pensar sempre com muita cautela sobre as consequências de sua ação para diminuir desigualdades. Essa é a grande alerta da pesquisa para qualquer educador.

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