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sua prática / relatos de prática

Despertando ideias, desbravando as palavras: a escrita representando a opinião

Suziane Brasil Coelho

08 de agosto de 2023

Escola Estadual Governador Adauto Bezerra
Fortaleza/CE

Só podemos dar uma opinião imparcial sobre as coisas que não nos interessam; sem dúvida, por isso mesmo, as opiniões imparciais carecem de valor”. Oscar Wilde

Na Grécia antiga, Aristóteles definiu a essência da retórica como sendo a persuasão do outro através da argumentação, que é impensável sem democracia e liberdade de debate. Diante disso, percebemos o quão importante é a oportunidade que a Olimpíada de Língua Portuguesa oferece a professores e estudantes de todo o Brasil, para que, juntos, possam desenvolver um olhar crítico sobre o local em que vivem e exercer plenamente a cidadania, desbravando os horizontes da democracia.

Encanta-me cada vez que tenho a oportunidade de participar de uma edição da Olimpíada, principalmente, pela oportunidade de envolver os estudantes no estudo dos gêneros, com o aporte das sequências didáticas, que visam explorar todos os aspectos linguísticos e textuais essenciais à produção escrita, além de incentivar a leitura crítica e envolvente daquele determinado gênero.

Exercer a cidadania por meio da expressão de sua opinião é uma prática linguística que agrega valores sociais, culturais e intelectuais que colaboram para o despertar do senso crítico essencial a qualquer cidadão. É essa riqueza de conhecimentos e de habilidades que me alegra e me motiva a trabalhar com o gênero Artigo de Opinião que, para mim, deve fazer parte da vida de todas pessoas, pois desperta um olhar consciente sobre os acontecimentos, sobre os problemas da sociedade e sobre as atitudes humanas. Aprender a refletir e a se manifestar é essencial aos jovens para que tenham, desde cedo, consciência de luta, garantindo, assim, seus direitos.

Em 2019, iniciamos o ano, nas aulas de produção textual, indagando aos estudantes do 3º ano o que eles entendiam por opinião. Em que situações da vida cotidiana nós temos a oportunidade de expor nosso ponto de vista sobre um determinando assunto e qual é o objetivo comunicativo dessa ação? Tais questionamentos visavam instigar os alunos a refletirem sobre o ato de opinar, a falarem o que pensam, sem medo de se expressar. Em seguida, para incentivar mais a capacidade reflexiva dos estudantes, lancei uma questão que divide opiniões de médicos, psicólogos, psiquiatras, policiais e familiares que consiste em: "O internamento compulsório de dependentes químicos ajuda ou dificulta a sua reabilitação"? Assim que a pergunta foi lançada, um burburinho começou entre os alunos e uma inquietação positiva tomou conta da turma. Dei um tempo para que eles pudessem conversar, analisar os prós e os contras e, por fim, formar suas opiniões. Construímos um momento de debate muito rico e interessante, em que cada um expressou a sua opinião, aprendendo também a ouvir e a respeitar a fala do outro.

Nas aulas seguintes, pedi para os alunos pensarem em questões polêmicas que envolvessem a cidade de Fortaleza, o local onde vivemos. Em grupos, eles foram conversar e buscar, em suas vivências, problemas, situações ou acontecimentos que estivessem provocando opiniões diferentes entre os moradores da cidade. Depois, fomos ao laboratório de informática pesquisar sobre as questões levantadas para que eles pudessem se munir de informações que embasassem os argumentos contra e a favor. Nesse momento, eles puderam perceber o quão importante é ter informações para se construir uma opinião, pois, assim como afirma o professor Manuel Carlos Chaparro, "a informação e a opinião não se separam, mas se misturam e interagem". Após esse momento de pesquisa, os estudantes compreenderam melhor a diferença entre opinião e informação, além de perceberem como essa interação fortalece a opinião, que deve estar embasada em fontes confiáveis para exercer plenamente seu poder de convencimento diante do interlocutor.

Segundo o escritor moçambicano Mia Couto, a escrita é uma "forma de reconhecer sua própria existência e ser ouvido". Com esse pensamento, demos início à primeira versão do artigo de opinião sobre o lugar onde vivo. Os estudantes, com base nas questões polêmicas referentes a Fortaleza, começaram a colocar no papel as suas opiniões e a sentir a sensação prazerosa de se reconhecer como um cidadão letrado que se manifesta criticamente sobre os problemas da sua cidade. Após a produção dessa versão inicial, realizamos, na biblioteca da escola, a leitura dos artigos de opinião disponibilizados no material da Olimpíada para reconhecer as características próprias desse gênero; identificar questões polêmicas, a posição do autor e seus argumentos. Em seguida, fizemos uma roda de conversa e cada grupo comentou sobre o artigo lido, compartilhando com os demais colegas tudo que foi observado nos textos.

O poder de convencimento está na força do argumento. Inicio as minhas aulas com essa frase, para que os alunos compreendam a importância de se escolher os argumentos certos para a defesa do ponto de vista, bem como observar o tipo de público a quem se destina o artigo, pois, assim, poderá selecionar melhor os argumentos e as informações que sustentarão a sua tese. Analisamos isso nos artigos que foram lidos e buscamos entender a relevância de se fazer uso de vozes para que o autor possa tecer a teia de sua argumentação e antecipar, inclusive, os possíveis argumentos contrários que talvez venham confrontar a sua opinião. Essa estratégia de antecipação do autor prepara o texto para refutar, de forma inteligente, pensamentos contraditórios que, por acaso, visem desconstruir a tese defendida.

Para que todas essas ideias tenham sentido e estejam interligadas de modo a cumprir a sua função comunicativa, é necessário que haja coesão, que, de acordo com Ingedore Koch, corresponde a "todos os processos de sequenciação que asseguram uma ligação linguística significativa entre os elementos que ocorreram na superfície textual". A fim de trabalhar a coesão com os alunos, realizei a atividade proposta no material e apresentei o quadro de elementos articuladores mais relevantes para o gênero em questão. Depois, recorremos a um dos artigos já lidos para analisarmos, dessa vez, os operadores argumentativos empregados pelo autor.

Enfim, após muitos dias de leitura, de estudo e de análises, a respiração profunda dos estudantes indica que as letras finais estão se encontrando, as ideias estão se casando e a opinião está se formando. Eles, agora, retomam os seus textos, leem as observações feitas, avaliam todos os aspectos estudados até então e os reescrevem, buscando a perfeição. Mas, calma, antes da entrega final, cabem ainda alguns retoques, aqueles finos detalhes que conferem à peça o acabamento primoroso do mais dedicado artesão. Nos dias que antecederam o resultado da Comissão Julgadora, torci muito que algum dos meus alunos conseguisse ser selecionado e, por fim, a alegria chegou para a estudante Rúbia Ellen, que é um exemplo de dedicação aos estudos e à escrita. Para ela, escrever é mais do que um ato mecânico, é uma forma de se representar, de pertencer ao mundo.

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