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sua prática / relatos de prática

Escritores à vista: os desafios de ensinar a escrever crônicas na escola

Adriana Cristina Furtado da Silva Idalino

08 de agosto de 2023

EM Adão Ferreira de Souza

Porto Grande/AP

 

“Hoje é domingo, 28 de fevereiro de 2016. Cai uma chuvinha fina aqui em Porto Grande (AP); momento perfeito para começar a escrever o relato de prática. Você pode perguntar: ‘relato de prática sem aluno, sem sala de aula, sem oficinas?’ - Isso mesmo. Este ano resolvi "começar pelo começo": acessei o site, fiz minha inscrição, baixei o regulamento, fiz a leitura, e com pensamento positivo começarei as atividades de planejamento. As aulas estão prestes a começar por aqui, e não quero de forma alguma deixar espaço para o desânimo ou culpar o tempo, ou a falta dele, para realizar todas as oficinas. É importante organizar tudo com antecedência para poder treinar com eficiência meus atletas das letras".

Deixei esse parágrafo escrito e guardado em uma pasta no computador. De lá pra cá, foram muitas oficinas com meus meninos escritores para desenvolver o tema “O lugar onde vivo”. Foi energia, coragem e trabalho. Quando recebi o e-mail da Etapa Municipal vibrei com cada palavra! Agora era esperar o resultado da Etapa Estadual. Mais uma boa nova! No dia 3 de outubro uma notícia especial. Minha aluna foi selecionada na categoria crônica para a Etapa Regional. Frio na barriga, lágrimas, e a certeza de que tudo valeu a pena! Em uma palavra: felicidade.

Vamos agora à nossa caminhada com o gênero crônica. As aulas começaram em março. Cheguei à escola cedinho porque o primeiro dia de aula é como se fosse um momento de estreia e, como em toda estreia, sinto certa ansiedade. Planejei com muito carinho a Oficina 1 - “É hora de combinar”. Falei com meus alunos sobre a Olimpíada, apresentei o vídeo dos finalistas e o mais importante: o papel de protagonista que cada um deles teria nesse processo. Até aí tudo bem, mas uma aluna fez a seguinte colocação: “Ah, professora, a senhora acha que a gente tem chance?” - Respirei fundo... precisava de uma resposta rápida e certeira. Aí falei que todos teriam as mesmas oportunidades e que na medida em que as oficinas avançassem eles iriam perceber que produzir uma crônica seria um exercício muito bacana de escrita e de treino do olhar para as coisas do dia a dia - e eu como professora não iria desistir de nenhum deles. A partir daí consegui manter meu grupo unido por um mesmo propósito: participar da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro 2016.

No desenrolar das oficinas passamos por algumas "pedras no meio do caminho". Em nosso município não há banca de revistas e o único jornal que temos por aqui é entregue uma vez por mês, fazendo um apanhado dos acontecimentos do município. Por isso, toda vez que era solicitado, durante as atividades, as leituras de crônicas dos jornais locais, eu ia para o plano B: pesquisava na internet os textos e trazia para sala de aula. Esse material foi organizado em forma de varal e disponibilizado a todos.

Procurei apoio também na sala de leitura da escola. Fizemos uma seleção dos livros de crônicas do acervo e levamos para sala de aula para fazermos um rodízio de leitura entre os alunos. Tudo isso para aumentar o repertório deles.

Na Oficina 3, “Primeiras linhas”, os alunos foram encorajados a produzir a primeira escrita. Mas como vencer o medo da folha em branco? O que escrever? Para uma boa crônica você deve educar o olhar e apurar os ouvidos para tantas histórias que circulam no dia a dia. Nessa etapa, levei uma convidada para sala de aula, uma moradora do bairro, contadora de histórias, para dialogar com os alunos sobre as suas vivências. A partir dos relatos, os alunos escreveram o embrião da primeira crônica. Nesse momento não me preocupei com a estrutura do texto, mas no romper da escrita na folha em branco. Outro aspecto interessante foi levar para a sala de aula as crônicas dos finalistas do estado, como suporte de leitura, para que os alunos pudessem se enxergar através dos enredos apresentados. Durante as produções dos alunos, também fiz uso do bilhete orientador direcionando a escrita rumo ao aprimoramento. Assim cada um dos meus escritores teria a dimensão do que estava bom e do que precisava ser melhorado.

Já na Oficina 5, “Uma prosa bem afiada”, para trabalhar Machado de Assis, trouxe para a turma uma série de imagens antigas da cidade do Rio de janeiro que, sem dúvida, serviram de cenário para as crônicas do Bruxo do Cosme Velho. Escutamos o áudio da crônica “Um caso de burro” para que os alunos percebessem a importância de um título sugestivo para o texto. O olhar aguçado do escritor chamou a atenção dos meninos, uma vez que foi reforçado o aspecto de que uma crônica nasce de situações, muitas vezes, simples do cotidiano.

Na Oficina 6, “Trocando em miúdos”, refletimos sobre a diferença entre notícia e crônica. Apreciamos a crônica “Cobrança”, de Moacyr Scliar, através da leitura dramatizada. Para fechar a oficina trouxe para palestrar em sala o locutor da rádio local para falar como são processadas as notícias veiculadas no programa jornalístico do qual ele faz parte.

Para dar mais "pano para as mangas" dos meus cronistas, realizamos na Oficina 8, “Olhos atentos no dia a dia”, um passeio fotográfico. Organizamos com antecedência os grupos da turma para que em cada um tivesse pelo menos um aluno com câmera fotográfica ou celular para fazer os registros. Elaboramos um roteiro que atendia os principais pontos do município - das barraquinhas da feira até a extinta estação de trem Porto Platon. Em sala de aula, socializamos as fotos dos grupos e as impressões da turma. Hora de escrever mais uma crônica! O assunto escolhido foi futebol, por isso retomamos a leitura da crônica “Peladas”, de Armando Nogueira, estudada na Oficina 4, “Histórias do cotidiano”. Consegui alguns exemplares do jornal local para que os alunos pudessem manusear, alguns pela primeira vez, as páginas daquela publicação, principalmente a seção de esporte, para ficarem inteirados sobre o campeonato de futebol que estava acontecendo no município.

Além do momento em sala de aula, marquei orientação personalizada no contraturno para atender pequenos grupos, para que pudessem revisar e reescrever seus textos. A partir daí vocês já podem imaginar: veio a Etapa Municipal, depois a Estadual e agora estamos aqui, minha aluna e eu, na Etapa Regional.

Toda essa caminhada contribuiu sobretudo para um redesenho da minha metodologia em sala de aula - do planejamento à aplicação das oficinas. Tudo isso trouxe um fortalecimento da minha prática enquanto professora da rede pública de ensino. Ganhamos todos, alunos e professores. No dizer dos versos do poeta João Cabral de Melo Neto "Um galo sozinho não tece a manhã: ele precisará sempre de outros galos. De um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro”. Assim, somos nós que acreditamos nessa tessitura da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro, e fazemos nosso grito ecoar através das histórias contadas por nossos alunos em todos os cantos desse país, retratando o olhar de cada um sobre o lugar onde vivem.

 


Fotos: Veronica Manevy

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