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Relato de prática: um texto à espera de sua autoria

Relato de prática: um texto à espera de sua autoria

A escrita do professor ganha destaque em artigo de Maria Cristina Zelmanovits

A escrita do professor ganha destaque em artigo de Maria Cristina Zelmanovits

texto - Maria Cristina Zelmanovits; ilustração - Criss de Paulo

07 de agosto de 2023

Tantas palavras. Apropriação da escrita por alunos e professores

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Relato de prática: um texto à espera de sua autoria

Comecemos nossa conversa com um fato curioso: os professores inscritos na Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro recebem exatamente as mesmas orientações para a realização do trabalho com cada gênero e, no entanto, percorrem trajetórias marcadas pela singularidade.

Em cada sala de aula, uma narrativa inédita é tecida todas as vezes em que uma oficina se põe em movimento. Guimarães1 nos oferece uma pista para a compreensão desse fenômeno:

O que vi, sempre, é que toda ação principia
mesmo é por uma palavra pensada. Palavra pegante,
dada ou guardada, que vai rompendo rumo.

Compondo-se com os Cadernos, a palavra pensada por cada professor cria realidades ajustadas às possibilidades e necessidades dos alunos, entrelaça os estudos com os saberes da comunidade, interpreta dificuldades, constrói nexos, gera nascimentos.

Essa situação de coautoria encontra espaço privilegiado para se legitimar nos “Relatos de prática”. Ao assinar sua experiência e compartilhá- la com seus pares, o professor torna público seu patrimônio particular de conhecimentos.

A explicitação e a análise da prática exigem distanciamento do calor da ação. Esse olhar em perspectiva permite que o professor investigue o vivido, recolha fragmentos, refaça trajetos, reflita sobre os caminhos do próprio trabalho e abra-se para a descoberta, para a interlocução e para a ampliação da própria aprendizagem.

O exercício da reflexão metódica e a construção da lucidez profissional não são questões triviais a um fazer docente que, como bem alerta Perrenoud2, caracteriza-se [muitas vezes] por agir na urgência e decidir na incerteza.

Por esse motivo, antes de avançarmos, recomendo a (re)leitura de textos apresentados em edições anteriores de Na Ponta do Lápis para a compreensão do que está em jogo quando se assume a tarefa de elaborar um Relato de prática. As sínteses a seguir têm o propósito de familiarizá-lo com alguns dos conteúdos presentes nos textos.

Narrar a experiência

Narrar a experiência

Apresenta reflexões sobre a singularidade da experiência vivida e sobre a função das narrativas. Evidencia como os autores dos relatos de prática influenciam a produção dos materiais da Olimpíada e oferece orientações para os professores que querem se arriscar a escrever.

Relato: jogo entre presente, passado, futuro

Relato: jogo entre presente, passado, futuro


Abordando as diferenças entre viver, lembrar, registrar e relatar, o texto trata do desafio de transformar a experiência – com seus sons, movimentos, cores, cheiros, gestos, rostos, lugares – em discurso escrito a ser socializado e compreendido.

 

Relatar a prática: como e por quê?

Relatar a prática: como e por quê?


Ao mesmo tempo em que diferencia planejamento, diário e relato de prática, o texto mostra a interdependência entre os três gêneros e oferece recomendações para a escrita de relatos.

Na prática a teoria é outra?

Relato: jogo entre presente, passado, futuro

Na prática a teoria é outra?


Diferenciando relato e relatório, o texto trata das marcas de autoria presentes no primeiro gênero e apresenta orientações para sua elaboração.

 

Voz do Professor

Voz do Professor


Apresenta e analisa o processo de aprendizagem profissional dos professores, suas reflexões e seus depoimentos ao experimentarem a metodologia proposta pela Olimpíada.

Conta-me agora! As narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e no ensino

Conta-me agora! As narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e no ensino


Reflexão teórica que recupera o sentido das narrativas e sua relação com a construção/ desconstrução das experiências do professor.

 

 

Encaixando peças


Aqui proponho uma espécie de jogo: uma peça é apresentada (fragmentos dos textos de estudo sugeridos anteriormente) para que você encontre sua correspondente (link para relatos dos professores). O objetivo é ajudá-lo a observar como as reflexões e as orientações dos textos de estudo foram incorporadas e traduzidas pelos autores dos relatos. Vamos lá?

 

Fragmento de


Conta-me agora! As narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e no ensino


O professor constrói sua performance a partir de inúmeras referências. Entre elas estão sua história familiar, sua trajetória escolar e acadêmica, sua convivência com o ambiente de trabalho, sua inserção cultural no tempo e no espaço. Provocar que ele organize narrativas destas referências é fazê-lo viver um processo profundamente pedagógico, onde sua condição existencial é o ponto de partida para a construção de seu desempenho na vida e na profissão.

Exemplo: o relato “O exílio onde eu vivo”, do professor Otávio Henrique Meloni, para lê-lo clique aqui.

 

Fragmento de


Relatar a prática: como e por quê?


Procure escrever colocando-se no lugar do leitor – tente fazê-lo entrar na sala de aula e enxergar o vivido como se tivesse estado presente, converse com o leitor, pense no que poderia interessá-lo e no que interessa apenas a você. Esse exercício de se colocar no lugar do leitor ajuda o autor a escolher o que dizer, ou seja, ajuda na seleção dos acontecimentos e na forma de apresentá-los.

Exemplo: o relato “O verso que não quer sair”, da professora Teresa Silva Dias, para lê-lo clique aqui.

 

Fragmento de


Na prática a teoria é outra?


Um relatório precisa parecer neutro [...]. O relato de experiência de prática pedagógica, ao contrário, é um gênero de texto que põe em evidência a autoria de quem o escreveu. As marcas de autoria aparecem no texto todas as vezes que o autor faz referência às experiências muito particulares que somente ele viveu com seus alunos, em sua sala de aula, em sua escola. Ao relatar essa experiência [...] o professor faz uso de pronomes pessoais e de tratamento, estabelecendo um diálogo com o leitor. Como o relato fala de situações experimentadas pelo autor, revela as sensações e emoções vividas nessas experiências. Isso é marcado pelo uso de adjetivos que aproximam o leitor dos sentimentos vividos por quem relata.

Exemplo: o relato “Um passado cheio de novidades”, do professor Wagner da Conceição Trindade, para lê-lo clique aqui.

 

Ao ler os relatos, você também pôde observar diferentes estilos, formas de organizar as narrativas, usos de recursos de linguagem, entre outros. Não existe, portanto, um modelo único. Muitas vezes, para encontrar o nosso jeito próprio de dizer, precisamos analisar outros jeitos.

Para conhecer relatos de outros professores, clique aqui.

 

Questões que ainda merecem maior investimento


Embora os relatos de prática venham avançando a cada edição da Olimpíada e já apresentem muitos aspectos positivos, a análise do conjunto de textos enviados ao longo do tempo indica certa desigualdade entre o espaço ocupado para descrever as ações do professor e aquele destinado à análise das produções dos alunos.

Entendendo que os conhecimentos prévios, os equívocos, as descobertas e as dificuldades dos estudantes ao longo do processo são valiosas matérias-primas para a ação do professor, o objetivo desta parte é oferecer modelos que dão contorno mais definido à avaliação das aprendizagens e contextualizam as intervenções docentes.

Presente no Portal Escrevendo o Futuro, o estudo “Lente de aumento na escrita” apresenta três projetos envolvendo gêneros textuais diferentes dos trabalhados pela Olimpíada. Se essa informação lhe causou estranhamento e o fez pensar – mas no que esse tal estudo pode me ajudar a escrever um relato de prática? –, então estamos em um bom momento da conversa.

Sugiro que observe, logo no início de cada projeto, a presença de um denominador comum que roteiriza as apresentações – projeto, situação de produção, produção inicial e análise dos textos dos alunos, procedimentos para aperfeiçoar as produções, produção final e publicação. Essa lista pode ajudá-lo a pensar em um planejamento global de seu texto.

https://www.escrevendoofuturo.org.br/conteudo/formacao/na-pratica/lente-de-aumento-na-escrita


Antes de avançarmos, um alerta se faz importante: “Lente de aumento na escrita” é um estudo, não um Relato de prática! Digo isso por saber que o espaço de que você dispõe para escrever é muito pequeno e não permite o uso de certos recursos (inclusão de imagens, por exemplo) apresentados nos modelos sugeridos. Mas, então, no que eles podem ajudá-lo?

 

Em linhas gerais,

  • a sintetizar as etapas de um projeto;
  • a observar como é feito o entrelace entre as atividades e as produções dos alunos.

 

E, mais especificamente,

  • o projeto “Cantos distantes” apresenta um diagnóstico da turma e as atividades criadas para ajudar os alunos a superarem os diferentes obstáculos da escrita mapeados;
  • o projeto “Contos de fadas do mundo inteiro no toque das mãos” apresenta um vídeo em que a professora explicita oralmente as hipóteses de sua turma com relação à paragrafação para contextualizar as atividades que precisou elaborar para ajudar seus alunos a avançarem nessa questão específica;
  • o projeto “Encantos de Mojuí dos Campos” apresenta atividades que visaram à melhoria dos aspectos discursivos e de conteúdo dos textos, questões representativas das dificuldades dos alunos nas produções iniciais.

 

Antes de ir

Não posso terminar esta conversa sem declarar que escrevo do lugar de professora, ou seja, daquela a quem cabe a tarefa de orientar, oferecer alimento e fazer mediações. No entanto, ao ocupar o lugar de escritora, sinto na pele o que um dos maiores conselheiros da escrita3 tão sensivelmente descreveu:

“As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou.”

Despeço-me desejando que o atrevimento da escrita visite cada um dos leitores deste texto. Se, como diz o poeta4, a palavra nos desafia, aceitemos o combate!

 


1. João Guimarães Rosa. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
2. Philippe Perrenoud. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2000; e A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2002.
3. Rainer Maria Rilke. Cartas a um jovem poeta. São Paulo: Globo, 2001.
4. Referência aos versos do poema O lutador, de Carlos Drummond de Andrade.

 



Maria Cristina Zelmanovits
é pedagoga e colaboradora do Programa Escrevendo o Futuro; atua como assessora de projetos de literatura e artes.

 


 

Revista Na Ponta do Lápis n. 27Revista Na Ponta do Lápis
Ano XII
Número 27
Agosto de 2016

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