Bloco 3

Oficina 2

Etapa 4

Roteiro

O roteiro organiza em cenas e sequências as imagens e sons que irão construir o discurso do filme, em conformidade com o que foi concebido e apresentado no argumento. E deve apontar como personagens, objetos, estratégias de abordagem entrevistas, material de arquivo, narração, etc. se articulam para a construção de um documentário original. É por estar diretamente relacionado à linguagem audiovisual que o roteiro do documentário constrói esse discurso a partir da descrição das imagens e sons que vão compor a obra, já na ordem em que se pretende que elas apareçam no filme. É como se, ao ler o roteiro, nós já conseguíssemos ‘’ver’’ o filme na nossa cabeça, imaginá-lo, parte por parte, até a imagem do todo. 

Evidentemente, durante as gravações e a edição podem ocorrer algumas mudanças, mas é importante que o roteiro já aponte qual a estrutura pretendida, que será com um guia a priori, mesmo que sofra alterações posteriormente. Assim, o roteiro também servirá como uma referência para as gravações uma vez que ao consultá-lo, o grupo se lembrará de gravar todas as imagens e sons que deseja que apareçam no documentário. 

Para sua elaboração, é importante pensar no objetivo de cada cena e/ou sequência, bem como no encadeamento dessas cenas, e discutir esses objetivos com o grupo. Algumas perguntas podem ajudar nessa reflexão e escolhas, como por exemplo:

  • Qual será a primeira imagem e som do filme e por quê? 
  • Quais sensações, ideias e emoções essa imagem e som podem provocar no espectador?
  • Qual será a segunda imagem do filme? E o segundo som? E como essa imagem e esse som se conectam com a imagem e som anteriores? E com os seguintes? Que sentido constróem juntos?
  • Haverá entrevistas? Qual será o/a primeiro(a) entrevistado(a) e por que essa pessoa e não outra? Quais perguntas serão feitas e o que queremos saber com essas perguntas?
  • Serão utilizados materiais de arquivo, como fotografias, documentos e vídeos caseiros? Com qual propósito e em quais momentos?
  • Haverá música? Qual? Quais sensações essa música pode gerar? Ela traz outra camada de informação/sentido ao que está sendo visto? Reforça ou se contrapõe à imagem?
  • Como o filme termina? A imagem escolhida para fechar o filme deixa qual impressão no espectador? Ela colabora para o ponto de vista que o filme pretende apresentar?

Tomemos a título de ilustração o curta-metragem documental Favela da Central, realizado pela Piá Produções, sobre o Movimento de Defesa do Favelado (MDF), formado por setecentas famílias que, em 2014, ocupavam um terreno particular no bairro Vila Prudente, em São Paulo.

Assista ao documentário e veja como poderia ter sido escrito um roteiro simplificado desse curta.

Dica: ao longo do filme você verá alguns comentários da equipe do Programa Escrevendo o Futuro. Se desejar assistir sem as observações, clique no ícone de comentários para desativá-los.

Favela da Central. Michael Miranda. Brasil, 2015, 3 min e 28 seg.

Agora, reveja o documentário Meu lugar, Ubaranas, participante da 6ª Olimpíada de Língua Portuguesa, em 2019, para em seguida analisarmos seu roteiro.

Meu lugar, Ubaranas. Bruna Santos Vitalino, Francisco André Silva de Moura e Lucas Cauã de Lima da Silva. Escola Barão de Aracati, Aracati/CE, Brasil.  2019. 5 min.

Leia abaixo o roteiro do filme, tal qual foi entregue pelos realizadores por ocasião do concurso:

  1. Sequência de abertura

Imagens do dia a dia de André, cenas cotidianas de sua vida. Destacam-se imagens do personagem arrumado na igreja. Imagens do lugar e de pessoas que lá vivem vão se alternando enquanto segue a narração.

Na sequência, o nome do documentário aparece em letras brancas e vermelhas sobre fundo negro.

  1. Sequências intermediárias

Depoimentos dos entrevistados, entremeado a imagens coletadas no local. Entre cada entrevista, um comentário rápido introduzindo, em over.

Os três entrevistados discorrem sobre suas memórias do lugar, cada um na sua abordagem.

Seu Pelé fala da sua chegada à comunidade, e sobre o regime semi-escravatório em que

trabalhavam e ocupavam as terras dos proprietários.

Dona Ana, líder do movimento quilombola, conta sobre a luta diária pela busca de direitos e reconhecimento. Desde o momento em que despertou para a realidade de que fazia parte de uma comunidade quilombola, até o reconhecimento pelo Governo Federal. Mais de uma vez ameaçada pelos herdeiros do engenhos, ela segue firme na luta e agora objetiva a posse de terras para trabalhar.

Dona Madalena, de poucos estudos, mas muita vontade, resguarda em cadernos escritos a punho, décadas de história de sua família e da própria comunidade. Ela fala sobre as motivações para escrever e lê trechos de seus cadernos.

  1. Sequência de encerramento

Imagens de André com amigos deslizam pela tela seguidas por outras imagens dele caminhando, sempre caminhando. Em off, narração falando sobre a incerteza do futuro e os vínculos de cada um com seu lugar natal.

Créditos finais

O roteiro de Meu lugar, Ubaranas é bastante bem sucedido ao explicitar a estrutura e construção do discurso do filme, e traz elementos interessantes que nos permitem imaginar a obra, mas ainda há alguns pontos que poderiam ser aprimorados, como: o maior detalhamento das imagens e sons que compõem o filme; as perguntas que serão feitas em cada uma das entrevistas; e a divisão mais pormenorizada das sequências, que embora não seja obrigatória, ajuda tanto na concepção e visualização da estrutura do filme quanto na organização para a gravação. Observe o seguinte trecho:

"Depoimentos dos entrevistados, entremeado a imagens coletadas no local. Entre cada entrevista, um comentário rápido introduzindo, em over."

Ao lê-lo podemos nos perguntar: a qual local esse trecho se refere? Quais serão os conteúdos dos comentários que introduzirão cada uma das entrevistas? De quem será a voz desses comentários?

A partir dessas questões, veja abaixo uma sugestão de reescrita desse trecho:

Imagens dos entrevistados alternadas com imagens de suas casas cômodos, quintais, fachadas, etc. André faz comentários, em voz over, sobre cada um dos entrevistados ou sobre sua relação com eles.

O roteiro de Meu lugar, Ubaranas também poderia citar as diversas imagens que expressam a delicadeza da vida de André, Seu Pelé, Dona Ana e Dona Madalena. Por exemplo, onde cita apenas ‘’cenas cotidianas’’ poderia ter descrito possibilidades para essas cenas, como: seu Pelé selando o cavalo e andando de carroça; André varrendo a frente da igreja etc.

A partir do que foi apontado como possibilidade de aprimoramento, veja uma sugestão de reescrita do roteiro de Meu lugar, Ubaranas:

Sequência de abertura

Sequência 1: André se aproxima da igreja e abre as portas do espaço. Imagens das casas das pessoas de Ubaranas: animais, cenas domésticas, crianças. Cartela de título do filme: Meu lugar, Ubaranas. Ao fundo, trilha musical suave e narração em voz over.

Sequências intermediárias

Sequência 2: apresentação de André e do lugar onde vive: André caminhando entre árvores; imagens de arquivo, fotografias e vídeos, do Ceará: Aracati e Canoa Quebrada. No som, trilha musical suave e narração em voz over, em primeira pessoa, apresentando André e sua relação com a comunidade.

Sequência 3: André andando de charrete; fotografia da família de André seguida de imagens de seu cotidiano em casa e na comunidade: tomando café da manhã, indo para escola, prestando atenção na aula. No som, trilha musical suave, e narração em voz over que continua a apresentação do personagem principal e sua comunidade, em primeira pessoa. Transição sonora para trilha musical mais solene sobre imagens de André varrendo a igreja e do interior dessa mesma igreja, no som o personagem revela que é uma grande responsabilidade e honra cuidar desse espaço.

Sequência 4: transição para música mais animada, acompanhando de imagens do córrego: cavalo bebendo água e pessoas pescando. Em seguida, imagem de Seu Pelé selando o cavalo. Narração em voz over fala sobre a população local e apresenta "Seu Pelé".

Sequência 5: entrevistas com moradores antigos de Ubaranas: Seu Pelé fala sobre a comunidade, suas atividades como agricultor e suas lembranças do passado: o trabalho em condições precárias análogas à escravização, as saídas para trabalhar fora escondido dos empregadores, para poder conseguir dinheiro para comprar coisas que desejava e precisava; Dona Ana fala sobre o reconhecimento enquanto comunidade quilombola e a história de Ubaranas; Dona Madalena folheia as páginas do livro "O Relicário de Ubaranas, memórias de um lugar quilombola" e fala sobre as dificuldades que enfrentou. No som, trilha musical suave de fundo e narração em voz over sobre a história de Ubaranas e o passado de escravização.

Sequência final

Sequência 6: Imagens dos jovens da comunidade conversando; seguido de André andando de bicicleta pelas ruas de terra de Ubaranas. Narração em voz over, em primeira pessoa, sobre incerteza de André de sair de Ubaranas e o  amor que sente pelo lugar.

Atividades

1. Exiba o curta-metragem de caráter documental Fotográfrica.

Fotográfica. Tila Chitunda. Pernambuco, Brasil. 2016. 25min.

Neste documentário, a diretora e roteirista Tila Chitunda narra a história de sua família, formada por imigrantes angolanos que se estabeleceram no Brasil. A narração da diretora é o fio condutor entre o presente e o passado da família. É interessante observar como a obra utiliza diversos elementos visuais e sonoros para apontar a ancestralidade daquele núcleo familiar, como o jogo de búzios, os documentos relativos à imigração, as fotografias, os tecidos africanos, a música e os depoimentos. 

Debata com os alunos a presença dos elementos citados acima no documentário Fotográfrica, e peça que eles revejam a obra e tentem escrever o roteiro do filme como exercício. 

Neste exercício de escrita, observe se os estudantes colocaram as cenas/sequências na ordem em que aparecem no filme e se estão numeradas, se apontaram as diferentes locações   como os diversos cômodos da casa de Dona Amélia, a casa de Dona Beth e as ruas de Olinda e se elencaram o uso de outras estratégias de abordagem além das entrevistas, como o uso de mural de fotos, imagens de passaporte, mapas, etc. 

2. Distribua os alunos em equipes e peça-lhes que escrevam o roteiro de seus documentários. Esse roteiro deve conter a descrição dos conteúdos de todas as cenas/sequências do filme, incluindo texto e imagem. Escreva na lousa ou prepare um cartaz com as orientações para a escrita.

Orientações para a escrita do roteiro:

  • Descreva o conteúdo imaginado para compor cada cena/sequência e as apresente na ordem sequencial de sua aparição (cena 1/sequência 1, cena 2/sequência 2, cena 3/ sequência 3, etc.). Dicas:
    • na descrição de cena/sequência indique o local de gravação;
    • sugira que tipos de imagens devem ser captadas para cada cena/sequência;
    • no caso de uso de narração ou cartelas, escreva o conteúdo do texto que acompanhará as imagens correspondentes;
    • se a cena/sequência inclui entrevista, indique quem será a pessoa entrevistada e coloque as perguntas que serão feitas.
  • Utilize uma linguagem simples e objetiva.
  • Use cerca de uma página para elaborar o roteiro.
  • Dê um título para o documentário e escreva-o acima do roteiro.
  • Revise o texto para checar ortografia, pontuação, sintaxe e estilo.

3. Na aula seguinte, distribua aos alunos os roteiros para que eles revisem e aprimorem o texto. Novamente, escreva na lousa ou prepare um cartaz com orientações para direcionar o trabalho de autoavaliação.

Orientações para a revisão do roteiro:

  • Descreveu o conteúdo de cada cena?
  • Definiu em quais locais serão feitas as filmagens?
  • No caso de uso de entrevistas, indicou o nome do entrevistado e disponibilizou o roteiro da entrevista?
  • Redigiu o texto da narração e/ou cartelas?
  • Escreveu um texto com uma linguagem simples e objetiva?
  • O roteiro tem cerca de uma página?
  • Você deu um bom título para o documentário e colocou-o acima do roteiro?
  • Checou se a pontuação está correta?
  • Corrigiu os erros de ortografia?
  • Substituiu palavras repetidas e eliminou as desnecessárias?

4. Defina uma data para a entrega da versão final dos roteiros.