Escola fábrica, fábrica escola

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Jairo Bezerra da Silva


Rotina automatizada pelo despertador, trânsito, semáforo, o cinza da cidade: tons sem vida ditam a rotina do estudante Jairo Bezerra da Silva, que registra com seu olhar cronista as semelhanças entre a escola onde passa seus dias e a fábrica que engole as horas do pai.


6h – despertador toca, sono, frio, eu me acordo, meu pai se acorda. Banho, escovar os dentes, colocar o uniforme, eu e meu pai. Trânsito, asfalto, semáforos, tudo de um cinza idêntico, nunca notei a diversidade de tons sem vida que existem na cidade. Só diferimos no lugar, eu vou para escola e meu pai para a indústria, mas no fim é tudo igual. Eu entro na escola e meu pai bate o ponto na fábrica, eu vou para meu assento e meu pai para sua máquina. O professor fala, as máquinas rugem, lápis, papeis, óleo, engrenagens, é tudo igual. Os funcionários não sorriem, querem seus salários; os professores estão exaustos, querem seus salários, para gastar com as mesmas coisas mês após mês. As mercadorias não pensam, não falam, são modeladas; os alunos não pensam, repetem, não criam, reproduzem o que lhe é passado, SILÊNCIO!!! Não podem falar. Números e letras sem cores, nos computadores e nos livros, nas planilhas e nos cadernos, é tudo igual. Os quadros se enchem, os cadernos se escrevem, as planilhas se preenchem, os gráficos estão cheios, é tudo igual. O professor fala, escreve, ensina o que nós não vamos aprender, apenas fingir saber. O gerente passa e os funcionários sorriem, satisfeitos em fingir satisfação e manter seu emprego e sua dignidade (dinheiro). As mercadorias são revistadas, as sem defeitos passam adiante e as demais retornam; a criatividade é tamanha que não mudaram nem o nome “série de produção”; os alunos também têm seus números de série, uma lista de chamada, são números, é tudo igual. Os sinos tocam, não são das igrejas, hora da refeição, fila no refeitório, hora do intervalo, celulares em mão, eu estou on-line e desconectado do mundo, meu pai está on-line e desconectado do mundo, sirenes tocam, hora de voltar, é tudo igual. Acabou, guardar materiais, pressa para finalizar um dia sem pensar que o próximo será igual. Carros, buzinas, placas, motos, uma gigante massa inerte de pessoas apressadas, é tudo igual. Chego em casa, wi-fi, me desconecto do mundo na rede; meu pai na televisão; minha mãe prepara o jantar; anúncios, propagandas, nos movem para um novo dia, estudo para ter um futuro, um futuro de compras, tudo igual. A noite desce, como a noite anterior, “AMANHÃ TEM AULA, VAI DORMIR!!!”, é tudo igual. Eu vou para a escola fábrica e meu pai para a fábrica escola. A única diferença entre a fábrica e a escola é o ambiente escuro, quente e mal iluminado da primeira, talvez a escola não seja assim para que os alunos sobrevivam até chegar na fábrica.
 


Professor Walber Barreto Pinheiro

CM Álvaro Lins, Caruaru-PE

 

17 thoughts on “Escola fábrica, fábrica escola

    1. para seguir na história da vida precisa primeiro estudar e alcançar um objetivo, escolher um caminho melhor para vida ou uma profissão.

  1. Parabéns, Jairo! A sua narrativa foi bem realista! Farei a narração do seu texto no meu canal do Youtube, assim como todos os outros textos vencedores da Olimpíada 2019. Gostaria de pedir o apoio de vocês na apreciação do meu canal e caso gostem dos conteúdos e possam se inscrever, agradeço. No meu canal, também tenho um outro quadro: Uma história, um reencontro.
    Visitei Pernambuco em 2017. Foi a realização de um sonho conhecer as belas praias, cultura e um povo receptivo! Amei!
    Parabéns também ao Professor Walber Barreto Pinheiro e todos os estudantes do CM Álvaro Lins
    Shirley – Contagem

  2. Parabéns Jairo!! Ótimo texto, bela comparação para nos situarmos na vida e no mundo!! Dá uma bela reflexão!! Parabéns a você e ao professor Walber B.Pinheiro!!!

  3. Uma reflexão tão madura e um estudante tão jovem! Uma forma crítica de escrever, carregada também de sensibilidade que emociona.

  4. Sinto-me bastante lisonjeado com as palavras de todos, foi uma honra participar desta edição da Olimpíada de Língua Portuguesa ao lado deste brilhante estudante de Caruaru-PE, o nosso cronista Jairo Bezerra. Obrigado meu querido Jairo Bezerra por nos proporcionar este momento histórico que ficará registrado em minha mente e coração por toda minha vida. Agradeço também a toda equipe organizadora da Olimpíada por esse trabalho belíssimo enaltecendo a nossa Língua Portuguesa.

  5. O texto nos deixa refletir no quanto estudamos e pra que estudamos seria para comprar ou pra se torna o pai que trabalha em uma indústria e veste o mesmo (dia e vive o mesmo uniforme)

  6. Parabéns pelo texto, tem muita potência! Precisamos questionar as práticas escolares ocidentais e sua mecanicidade esvaziada de sentido. Se a escola deve ser um espaço de formação, que seja uma formação libertadora, que obra mentes e não imponha “verdades” absolutas.

  7. Realmente, o texto é bem interessante, pois nos mostra a realidade de muitas escolas do nosso Brasil, para que se possa realmente mudar a forma de olhar o aluno , que não deve ser um deposito de informação como diz , Paulo freire , quando fala de uma educação bancaria, mas que seja um ambiente onde se constroi um ser mais crítico.

  8. Esta leitura nos aponta a vivência nas transformações; que devem acontecer na vida do aluno para uma educação rica e significativa de aprendizado..

  9. eu gostei muito da sua produção pois pode nos levar a refletir como é o mundo de fora. Como nos estamos na pandemia não podemos sair mais não por isso podemos observaras ruas, os semáforos e muito mais, e como você falou no texto que você nunca tinha visto a diversidade na cidade eu também nunca tinha e quando a gente percebe é uma descuberta importante para nos gostei muito do seu texto

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